Os leitores deste humilde blogue devem estar pensando que eu virei as costas para a escrita, que fui tomada pela preguiça e outras coisitas más. No entanto, a verdade é que eu ando gastando todo o meu potencial no word para fazer os 27263417 artigos que servirao de trabalho final do período na faculdade. Eis um deles:
SENSIBILIDADE, SEM RAZÃO
Um ensaio sobre a pena de morte a partir do artigo “Razão e Sensibilidade” de Renato Janine Ribeiro
Questões de fé não se discutem. Quem acredita em Deus, redenção e castigo que reze pela alma do menino João Hélio. Nós, homens vivos, precisamos é de atitudes. E atitudes sérias contra esses monstros que fizeram algo tão terrível contra um menino tão bom e puro, filho de uma família de bem.
A cadeia é muito pouco para os monstros que destruíram a vida de sonhos deste menino. Daqui a menos de dez anos eles serão libertos por uma justiça fraca e torpe. E, afinal, eles não tem mais jeito mesmo, porque dar tantas dívidas ao contribuinte de bem sustentando esses marginais em uma prisão perpétua? Vamos matá-los logo. A pena de morte é o ideal para casos hediondos de assaltos que deram errado.
Mas devemos então também matar aqueles que, através de planejamento frio, selecionam suas vítimas, adentram lares, estupram mulheres e crianças na frente de suas famílias. Malditos seguidores de Charles Manson, ainda se dizem doentes mentais. Doentes mentais, nada. É maldade pura, cadeira elétrica neles.
Não, pensando bem, pena de morte é muito pouco diante do sofrimento dessas famílias. Esses verdadeiros demônios merecem padecer na cadeia por um tempo, para depois morrerem. Para isso, basta não mais pensarmos em reforma penitenciária e deixar os presos fazerem sua própria lei. Estupros, espancamentos, torturas...umas boas porradas não farão mal nenhum a esse tipo de escória. Resolvido o problema: dez anos de uma cadeia ao “deus dará” e depois, pena de morte. Podemos chamar isso de “pena especial”. E o contribuinte, feliz, não precisará mais dar nenhum real para sustentar esse tipo de marginal.
Mas como todos são iguais perante a lei, temos que prender também aquele policial que mata as crianças da favela. Ou as crianças da favela são menos inocentes do que o menino João Hélio? Botemos na “pena especial” todos os policiais corruptos e malditos traficantes que fazem das pobres crianças trabalharem na indústria do tráfico. Além dos grandes traficantes, também merecem a pena aqueles que fazem um verdadeiro terrorismo urbano com arrastões que sempre terminam em morte nas praias do Rio de Janeiro.
O que dizer então de um juiz que roubou 500 milhões? Ele também foi responsável pela morte de vários, já que com esse dinheiro poderíamos salvar milhares de nordestinos da fome e sede, por exemplo. Criminosos do colarinho branco não são menos criminosos que os do colarinho vermelho, certo? É tudo farinha do mesmo saco, ou seja, merecem “pena especial”. Ah, não posso permitir que o caro leitor desse texto pense que nós nos preocupamos com os nordestinos. Não, não é isso. É que se eles não passassem fome e sede, não desceriam para o sudeste causando toda essa violência que nos atinge. Por isso, e só por isso, devemos punir severamente os responsáveis. E alguns dos nordestinos.
Essa pena deve ser aplicada também aos políticos do mensalão e aos condenados pela polícia federal em licitações. Isso geraria um verdadeiro caos, eu sei, mas temos que ser justos, certo? Ainda que isso envolva a maior parte da classe média alta.
A verdade é que o país está assim porque temos um presidente semi-analfabeto. A culpa é dele, não há como negar. Este sim, e todo o seu partido, devem sofrer muito para sentirem o que o povo sente. O povo rico, claro. Porque o pobre já está todo atrás das grades a essa altura.
Então, tecnicamente pensando, a maioria da população é responsável por estas e muitas barbáries. A situação da cadeia “especial” ficaria muito delicada e nós, nunca nos sentiríamos seguros o suficiente. Melhor invertermos a coisa: colocamos todos os criminosos nas ruas e nós, poucos inocentes que restarmos, nos sentiríamos muito mais seguros atrás de pesadas grades de ferro. Eles que se matem lá fora. E então, quando acharmos que a chacina estiver terminado, poderemos sair e construir uma nova, bela e feliz sociedade, baseada na moral e bons costumes. Pena que, ao sair, encontraremos um cenário nada agradável, cheio de cadáveres e falta de recursos. Então começaremos a brigar pelo novo poder e tudo aconteceria de novo.
É, acho que não temos jeito mesmo. Melhor todos nós nos matarmos tal qual aquele ditado: olho por olho, toda a humanidade fica cega. Parece que diante de certos crimes, ficamos meio caolhos.
Ah, só para constar, não fui eu, uma estudante universitária boba quem se atreveu a prever tal cenário de caos, e sim grandes escritores adorados pelos mesmos cidadãos de bem que pedem tanto a pena de morte.
É preciso, nesses momentos, colocar a razão um pouco acima da sensibilidade. Afinal, isso é justiça e foi esse o contrato social que assinamos. Ok, não assinamos, mas é ele que nos foi imposto. Durkheim que o diga. E o contrato diz: “Hobbes e Locke postulavam um 'estado de natureza' original em que não haveria nenhuma autoridade política e argumentavam que era do interesse de cada indivíduo entrar em acordo com os demais para estabelecer um governo comum. Os termos desse acordo é que determinariam a forma e alcance do governo estabelecido: absoluto, segundo Hobbes, limitado constitucionalmente, segundo Locke.” Russeau, por sua vez, questiona porque o homem vive em sociedade e porque se priva de sua liberdade. Vê num rei e seu povo, o senhor e seu escravo, pois o interesse de um só homem será sempre o interesse privado. Os homens para se conservarem, se agregam e formam um conjunto de forças com único objetivo. No contrato social, os bens são protegidos e a pessoa, unindo-se às outras, obedece a si mesma, conservando a liberdade. O pacto social pode ser definido quando "cada um de nós coloca sua pessoa e sua potência sob a direção suprema da vontade geral". Rousseau diz que a liberdade está inerente na lei livremente aceita. Considera a liberdade um direito e um dever ao mesmo tempo.
Pelo que se entende, portanto, abrimos mão de parte da nossa liberdade em troca de leis que nos regessem. Se quebramos as leis, que nos tirem a liberdade. Hora nenhuma se falou em tirar nossa vida ou nossa integridade física. O contrato que eu sigo me dá garantias chamadas “direitos humanos”, que parecem terem sido esquecidos há muito. Além do mais, se eu matar alguém com requintes de crueldade e depois o Estado, para me punir, fizer o mesmo, quem irá punir o Estado?
Saindo um pouco do campo filosófico, ainda podemos citar estatísticas que mostram que a pena de morte não diminuiu a criminalidade nos lugares onde foi estabelecida. E que a idéia da prisão perpétua ser mais cara do que a pena de morte é apenas um mito. Além, é claro, dos inúmeros erros de se aplicar uma pena irreversível para alguém que, por mais remota que seja a possibilidade, ainda pode ser inocente.
Como punir com a morte e o sofrimento uma patologia que aflige toda uma sociedade? É difícil pensar claramente durante momentos críticos como a morte de um menino que foi arrastado por quarteirões em um carro, mas no campo da justiça a razão deve subjugar a sensibilidade, sempre. Todos somos culpados da situação de violência em que se encontra nosso país, em maior ou menor grau. Reformas políticas, educacionais, carcerárias e auxílio de psiquiatras forenses podem ser mais demorados na solução da violência, porém são muito mais eficazes.
E para o jornalista/filósofo Renato Janine Ribeiro recomendo os livros “O Alienista”, de Machado de Assis; “Ensaio sobre a Cegueira”, de José Saramago; e “A Sangue Frio”, de Truman Capote. Quem sabe essas obras não mexam um pouco com a sua sensibilidade.
Viram? É foda...foda...